A OpenAI deixou de ser um laboratório e virou uma plataforma de crescimento. O artigo “OpenAI Readies Itself for Its Facebook Era” do portal The Information, descreve uma transição estrutural e cultural: o centro de gravidade da empresa se moveu da pesquisa para o engajamento, e da ética para o faturamento. É o ponto em que a missão de “beneficiar toda a humanidade” se encontra com o modelo de “reter usuários e vender atenção”.
Um em cada cinco funcionários da OpenAI veio da Meta. Isso não é coincidência; é estratégia. Fidji Simo, ex-chefe do app do Facebook e arquiteta do negócio de anúncios mobile, agora lidera todas as aplicações de consumo da OpenAI. Vijaye Raji, ex-líder de engenharia em produtos de engajamento como Messenger e Marketplace, virou CTO de Applications. Kate Rouch, responsável por escalar o marketing do Facebook de 500 milhões para 3 bilhões de usuários, assumiu o marketing global.
Essas contratações importaram uma cultura orientada a métricas de crescimento, DAUs, retenção, tempo de sessão, e deslocaram o prestígio interno da pesquisa para o produto. O resultado é uma empresa que pensa mais como rede social do que como laboratório científico.
A estratégia de produto reflete esse novo norte. O ChatGPT Atlas Browser transforma a IA em porta de entrada para a internet: uma tentativa explícita de criar um ecossistema fechado, coletar dados de intenção e ampliar o tempo de uso. O Operator, agente proativo capaz de executar tarefas completas, aprofunda o vínculo e gera dependência.
A lógica é conhecida: quanto mais o usuário delega, mais o sistema aprende e mais difícil é sair. O objetivo não é apenas melhorar modelos, mas construir o “Google Chrome da era IA”, controlando interface, dados e monetização.
O romantismo da pesquisa cedeu lugar à matemática do custo. Em apenas seis meses de 2025, a OpenAI perdeu US$ 7,8 bilhões e queimou US$ 2,5 bilhões em caixa.
Projeta-se um gasto cumulativo de US$ 115 bilhões até 2029, com lucro só em 2030.
Com 800 milhões de usuários, quase todos gratuitos, a receita de assinaturas e API não cobre o custo de GPU e infraestrutura.
A saída é inevitável: publicidade. Sob Fidji Simo, a empresa já estrutura sua ad-tech interna, com vagas para engenheiros de “paid marketing platform”. Internamente, estimativas falam em US$ 1 bilhão em 2026 e US$ 25 bilhões até 2029.
Curiosamente, enquanto importa executivos da Meta, a OpenAI se opõe à sua filosofia técnica. A OpenAI aposta em modelos fechados, monetizados via API e assinaturas. A Meta aposta em open source, com o Llama distribuído gratuitamente mais de 650 milhões de vezes.
É uma disputa entre centralização e descentralização. A OpenAI busca domínio pela escala do produto; a Meta, pela escala da comunidade. Se modelos abertos forem “bons o suficiente”, o poder de precificação da OpenAI se dissolve. Por isso o movimento para criar produtos de consumo, ChatGPT, Sora, Atlas, é também uma defesa: construir um moat baseado em hábitos, não em performance técnica.
O artigo mostra o ponto de ruptura entre missão e modelo. A OpenAI nasceu sem fins lucrativos, transformou-se em “capped-profit” e agora vive a fase growth. As saídas de pesquisadores de safety, como Jan Leike, simbolizam a inversão: “a segurança ficou em segundo plano diante dos produtos brilhantes”.
O plano publicitário acentua o risco. Usar conversas íntimas para segmentar anúncios rompe qualquer limite de consentimento. A IA conhece emoções e vulnerabilidades, e pode explorá-las. O perigo não é apenas vender espaço, mas moldar comportamento. Se o modelo otimiza engajamento, ele tende a ser persuasivo, não verdadeiro.
A OpenAI se move entre dois abismos: a insustentabilidade financeira e a erosão de confiança. O modelo de anúncios garante caixa, mas ameaça a credibilidade do assistente; manter o status atual preserva a ética, mas coloca em risco a sobrevivência.
A empresa aposta que pode aprender com os erros da Meta sem replicá-los.
O problema é estrutural: toda plataforma otimizada para atenção distorce intenções humanas. A questão não é se a OpenAI será regulada como a Meta, mas quando.
A “era Facebook” é irreversível. A OpenAI trocou o ideal da AGI para todos pelo imperativo de monetizar bilhões de interações. O novo jogo não é treinar o modelo mais avançado, mas controlar o canal onde ele atua.
Se conseguir equilibrar escala comercial e governança ética, pode se tornar o Google da IA. Se falhar, pode repetir o mesmo ciclo de erosão de confiança que marcou a Meta. O legado de Sam Altman dependerá de uma resposta simples, mas decisiva: quem a IA servirá primeiro, o usuário ou o anunciante?




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Texto sensacional!!