R$ 1,1 bilhão em receita. Marca avaliada entre as dez maiores do mundo. Audiência digital maior que a de qualquer clube europeu fora do Top 6. E mesmo assim, déficit de R$ 181 milhões e instabilidade crônica dentro de campo.
O Corinthians já é uma potência comercial. O que falta não é apelo. É operação.
Falta traduzir o que já se construiu fora das quatro linhas em estrutura, estabilidade e performance no jogo que realmente importa: o de dentro de campo.
Se eu estivesse à frente da área de digital e de negócios do Corinthians, encararia o clube como um produto em escala nacional, com distribuição pronta, comunidade ativa e brand equity consolidado. O desafio não seria atrair usuários. Seria reter, monetizar e sustentar performance com base nessa vantagem histórica.
É possível transformar o futebol do clube em um ativo autossustentável se tratarmos o Corinthians como o que ele já é: o maior produto de massa do país.
Do amor à recorrência: o Fiel Torcedor ainda não virou negócio
O Corinthians tem 27 milhões de torcedores. E só 130 mil membros ativos no Fiel Torcedor. Em termos percentuais: 0,48% da base engajada.
Essa subutilização não é técnica. É estrutural.
O programa, criado em 2008 e renovado ao longo dos anos, ainda opera como um clube de descontos com prioridade em ingressos, não como um motor de relacionamento, recorrência e lifetime value.
Em 2024, o programa gerou R$ 27 milhões. Isso representa menos de 2,5% da receita total do clube. O mais grave: o número é praticamente o mesmo desde 2015. Ou seja, a base cresce, os canais aumentam, os produtos se diversificam, mas a conversão estagna.
A hipótese que guia esse redesenho é simples: o Fiel Torcedor não precisa ser reinventado. Ele precisa ser operado como um produto.
Isso significa reestruturar o programa com camadas claras de valor: conteúdo exclusivo, experiências simbólicas, gamificação emocional e status público de pertencimento.
O clube já começou a testar isso com a assinatura no Instagram por R$ 7,90. É um bom sinal. Mas tímido. Desconectado de um produto maior.
Com uma estratégia baseada em dados e upgrades, é possível dobrar a base em dois anos e elevar o ticket médio para R$ 52. Isso significaria saltar de R$ 27 para R$ 75 milhões em receita recorrente.
Mais do que o número absoluto, o valor está na previsibilidade. Um Fiel Torcedor bem operado oferece fluxo de caixa, margem positiva e uma comunidade pronta para experimentar, comprar e amplificar.
Premissas:
A base ativa atual está em torno de 130 mil membros.
Ticket médio mensal estimado em R$ 37,5.
Churn alto, recorrência baixa e quase nenhum modelo de upsell.
Hipótese: Com uma nova estrutura centrada em upgrades e recompensas progressivas, é viável:
Dobrar a base em 2 anos.
Elevar o ticket médio para R$ 52 com planos customizados.
Aumentar retenção com novas camadas de pertencimento simbólico.
Projeção:
Ano 1: +26 mil membros novos.
Receita incremental: R$ 16,2 milhões.
Ano 2: +33 mil membros adicionais.
Receita acumulada incremental: R$ 37 a 40 milhões.
Riscos:
Percepção de valor dos planos precisa ser reformulada.
Estrutura de dados e CRM ainda é limitada.
Desempenho do time impacta diretamente a retenção emocional.
Hoje, o Corinthians tem LTV negativo com sua base. Está literalmente queimando o amor que recebe, porque não sabe transformar isso em valor.
A Arena é o ativo mais subaproveitado do futebol brasileiro
A Neo Química Arena gerou R$ 94 milhões em 2024. Mas custa mais de R$ 2,5 milhões por mês para operar e carrega uma dívida de ~R$ 668 milhões com a Caixa. No papel, é um centro de receita. Na prática, é um peso estrutural.
Hoje, o estádio funciona como palco de partidas. Quase nada além disso. Mas poderia ser uma plataforma contínua de receita, com eventos, assinaturas corporativas, naming rights internos, experiências licenciadas e uso inteligente dos espaços.
A Arena já tem estrutura para isso: o Átrio, o Fiel Coworking, o Centro de Convenções, o Brahma Lounge. Mas são subexplorados, mal comunicados e financeiramente inexpressivos.
Com uma equipe dedicada, o clube pode saltar de 15 para 100 eventos por ano. Pode lançar modelos de assinatura empresarial para camarotes, ativar espaços com marcas e integrar esses benefícios ao Fiel Torcedor como moeda simbólica.
Projeção conservadora: até R$ 28 milhões a mais por ano.
O risco está na fragmentação: contratos legados, cultura operacional antiga, falta de sistema unificado de gestão comercial. Mas é exatamente por isso que o clube precisa parar de ver a Arena como estrutura, e passar a tratá-la como produto.
Enquanto isso não acontece, o Corinthians paga caro para manter um espaço que dezenas de empresas pagariam mais caro para usar.
Hipótese:
Com uma operação dedicada de business development, é possível:
Aumentar o uso do estádio para eventos de 15 para 100 dias por ano.
Criar um modelo de camarote recorrente para empresas médias.
Desenvolver ativações sazonais de naming rights com marcas parceiras.
Projeção:
Eventos e B2B: R$ 18 a R$ 25 milhões/ano.
Assinatura de camarotes: R$ 3 milhões/ano.
Total: até R$ 28 milhões de receita incremental em 12 a 18 meses.
Riscos:
Complexidade operacional alta.
Resistência da cultura tradicional do clube.
Baixa adesão inicial sem prova de valor tangível.
A Arena precisa deixar de ser um passivo fixo e se tornar um produto vivo, acessível, inteligente e integrado ao ecossistema digital do clube.
Milhões de seguidores. Quase zero de receita.
Em maio de 2025, o Corinthians somava mais de 41 milhões de seguidores nas redes. Foi líder em visualizações no X, teve mais de 100 milhões de views no perfil da base em um ano e chegou a crescer 208 mil seguidores em um único mês.
Esse volume de atenção coloca o clube no mesmo patamar de mídia de grandes conglomerados. Mas o valor gerado vai para patrocinadores, não para o clube.
Em 2024, o Corinthians foi o 10º clube no mundo em geração de mídia para parceiros: €49 milhões. Mas capturou pouco disso como receita direta.
O clube testou iniciativas: assinatura no Instagram, fan token na plataforma Socios.com, ativações com jogadores como Depay. A ação com o atacante holandês gerou 915% a mais de postagens, 400% a mais de buscas no Google na Holanda e abriu negociação de direitos de transmissão no país.
Mas são casos isolados.
A operação ainda não funciona como produto. E deveria.
Com uma plataforma digital própria, conteúdos exclusivos e experiências gamificadas por assinatura, é possível converter 1% da base digital em pagantes. Isso já traria R$ 11 a 13 milhões por ano em receita nova, sem depender de venda de jogador, nem de patrocínio.
O risco está no ciclo: lançar sem entregar, prometer sem jornada, escalar sem sustentação.
Mas a base já está lá. O torcedor já paga, para outros. O que falta é transformar engajamento em relação de troca. E isso exige produto, não só presença.
Proposta:
Plataforma própria de conteúdo exclusivo (bastidores, base, feminino, convidados).
Clube de assinaturas segmentado por modalidade (ex: R$ 9,90/mês para acesso premium ao time feminino).
Merchandising digital: experiências gamificadas, filtros, acesso a colecionáveis e ativações com marcas.
Projeção conservadora:
1% da base ativa das redes (410 mil) convertendo a R$ 9,90 = R$ 48 milhões/ano.
Meta realista ano 1: 100 mil assinantes = R$ 11,8 milhões/ano.
Riscos:
Falta de calendário editorial robusto.
Churn alto se a experiência não for relevante ou exclusiva.
Barreiras técnicas e de licenciamento de imagem.
O Corinthians precisa deixar de ser o canal para os outros monetizarem. E passar a ser o produto.
Só dá pra competir em campo quando a operação para de sangrar
Mesmo com EBITDA positivo de R$ 292,8 milhões, o Corinthians fechou 2024 com um déficit líquido de R$ 181,8 milhões. O motivo? Despesas financeiras altíssimas, passivos acumulados e estrutura inchada.
Para compensar, vendeu jogadores: R$ 338 milhões em transferências, quase um terço da receita total. Wesley, Moscardo e Carlos Miguel foram embora antes que pudessem marcar época.
A base virou plano de emergência. E o time, moeda de liquidez. Mas isso muda se o restante da operação funcionar.
Com Fiel Torcedor convertendo melhor, Arena gerando receita contínua e audiência digital monetizada com recorrência, o clube cria estabilidade. E pode, pela primeira vez em anos, reter jogadores por decisão, não por falta de proposta.
Um time forte impulsiona matchday, ativa mais patrocinadores, converge mais torcedores para os produtos e aumenta o valor da marca. E isso volta em receita, engajamento e performance.
O futebol vira o centro. Não o buraco a ser coberto.
Esse é o ponto final da lógica de produto: quando a operação gira bem, o time volta a competir com consistência. A base deixa de ser commodity. O profissional vira alavanca.
Futebol é o produto mais apaixonante que existe. Mas produto precisa de gestão.
O Corinthians já tem o que empresas gastam bilhões para construir: audiência, marca, cultura, presença, atenção.
Só falta funcionar.
Não com mais campanha. Mas com estrutura. Com clareza. Com time de produto, dados, CRM, ciclo de vida, assinatura, monetização, backlog e visão sistêmica.
Porque o torcedor já está aqui. Só falta o clube operar à altura.
A paixão existe. O que falta é não desperdiçá-la!
Obrigado por compartilhar um… TCC!
Excelente, Chiodi!!