Produteiros brasileiros e a relação com o mercado de trabalho gringo
Alguns insights e dados para quem está considerando essa importante guinada profissional
Dentre o período de 30 de janeiro a 24 de abril de 2023 o Código Fonte conduziu uma pesquisa voltada aos programadores brasileiros. Já em sua 3ª edição, 17818 profissionais ao todo responderam uma série de perguntas que ajudam a traçar informações extremamente pertinentes sobre características desse público.
Dentre as informações destacadas, uma em específico chama a atenção: o percentual de programadores que pretende se mudar para o exterior ou já trabalha lá (57,51%) supera o número de profissionais que não desejam deixar o país (42,49%).
Percentual de programadores brasileiros que desejam, em algum momento, passar a atual no exterior em 2023.
E dentre a pequena amostragem de brasileiros que já atuam no exterior de 390 pessoas (equivalente a 2,12% dos respondentes), a maior parte não deseja voltar a trabalhar ou viver no Brasil.
Programadores que atuam no exterior e desejam retornar ao Brasil.
Esse tipo de análise trás uma visão já popularizada entre a área de produtos e tecnologia no Brasil: o desejo de atuar em uma empresa no exterior.
Seja por diferentes razões que iremos explorar a seguir, existe um ímpeto em obter experiência em diferentes países em busca de uma melhor qualidade de vida e alavancagem na carreira profissional.
Avaliando dados mais abrangentes podemos encontrar outra pesquisa relevante conduzida pela FGV Social (ou Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas) e divulgada em 2021: 47% dos jovens entre 15 a 29 anos querem sair do Brasil em busca de estabilidade.
Isso porque acreditam que fora do país há melhores condições de vida e oportunidades.
E esse movimento foi acelerado com o período de pandemia, conforme dados extraídos em novembro de 2022 da Husky, plataforma que facilita o recebimento de transferências internacionais, mostram: O número de profissionais que vivem no Brasil mas trabalham para o exterior aumentou 491% entre 2020 e 2022.
Direcionamentos por profissionais de mercado
Com essa crescente busca por trabalhos freelancer ou empregos efetivos, não é de se estranhar que diferentes influenciadores e plataformas passaram a trazer insights a partir de diferentes experiências vivenciadas.
É o caso do #jobnagringa, iniciativa que começou com conteúdo postado em formato de textos via LinkedIn com instruções de dicas em relação a busca efetiva de oportunidades fora do país, tirando dúvidas realizando mentorias pontuais com alguns seguidores, mas que já planeja o desenvolvimento de uma plataforma que trás mais informações e direcionamentos efetivos aos seguidores.
Dentre os principais entraves de profissionais na busca por oportunidades do exterior, Gabe Bo, co-criador da plataforma, ressalta dois deles:
“Crise de ambição”: Muitos profissionais que procuram pelo #jobnagringa tem uma espécie de síndrome do impostor, uma vez que os brasileiros acham que é uma coisa de outro mundo trabalhar fora do país.
Muitos acreditam que somente pessoas de faculdades de renome internacional (como Havard, MIT etc) tem capacidade para disputar vagas ais visadas, quando na verdade existem muitas pessoas com formações tradicionais disputando oportunidades no exterior a todo instante, com uma competição extremamente viável.
Pessoas que subestimam o próprio inglês: acreditam que o inglês não está pronto, que a falta de vivência em outra país é um grande impeditivo. Entretanto, vale ressaltar que normalmente as empresas que contratam pessoas no exterior também buscam por talentos em diversos outros países além do Brasil.
Por consequência, os mais diversos sotaques podem ser ouvidos nessas organizações: leste europeu, Ásia, outros países da américa latina e outros compõe muitas organizações no exterior, então o sotaque de um profissional brasileiro acaba se tornando apenas mais um dentre vários que podem ser ouvidos em empresas com esse perfil.
Motivos de busca por uma oportunidade fora no país
Gabe ressalta que a maior parte do público em contato com a rede é constituída por Designers, desenvolvedores e produteiros (sendo POs ou PMs).
E, dentre todas as pessoas que buscam uma oportunidade fora do país, duas razões são as principais para tal:
Condição financeira: Ganho em moeda estrangeira alavanca a qualidade de vida consideravelmente, e é o principal motivo por trás da busca por oportunidades na gringa.
A possibilidade de elevar consideravelmente a realidade de vida (em especial quando se trabalha remotamente no Brasil mas ganhando em uma moeda estrangeira) acaba sendo um grande chamariz.
Ainda segundo a pesquisa feita pelo Código Fonte, a média salarial dos programadores que residem fora mas pretendem voltar ao país é R$ 20.656,01, enquanto a média dos que não pretendem retornar é de R$ 22.450,46.
Média salarial dos que residem no exterior por quantidade de respondentes e país.
Possibilidade de trabalho remoto, sem a necessidade da vinda presencial na empresa. Esse é um fator já conhecido no mercado, uma vez que o trabalho remoto passou a facilitar o acesso de trabalhadores de regiões com menos oportunidades profissionais com vagas à distância.
Essa possibilidade acaba sendo o segundo principal motivo pela busca de uma oportunidade profissional em outra nação.
Vivência na prática
Não é incomum alguém da área de produto estar familiarizado com pessoas que trabalharam fora do país, e para trazer alguns insights de vivências internacionais o Fábio Duarte parece ser uma pessoa com experiência de sobra nesse sentido, já tendo ocupado posições como Head de Produto e ter trabalhado e resido em três países diferentes.
Em suas experiências por Canadá, Holanda e Portugal, ele destaca os principais desafios enfrentados por ele durante essas experiências:
Fit cultural: Em alguns ambientes profissionais (em especial aos abertos para contratações de diferentes países) podem existir muitas pessoas distintas trabalhando com diferentes filosofias, sem um direcionamento claro por parte da cultura da empresa.
Alguns exemplos práticos envolvem interações que ao nosso ver brasileiro podem parecer meio duras, mas para pessoas de diferentes nacionalidades são corriqueiras.
A realização de um feedback, por exemplo: a falta de cordialidade pode ser interpretada como muito duro, sem tato por nós. Mas para outros perfis pode ser uma forma apenas assertiva e concreta para sua realização.
A questão cultural vai também além do ambiente profissional: quantas pessoas você não conhece que não se importam em morar em regiões com frio abaixo de zero, mas outras acham inadmissível a mera ideia de passar frio? Todas essas questões precisam ser levadas em consideração antes de uma transição efetiva.
Outra questão que precisa ser levantada é a da própria xenofobia: é preciso estar psicologicamente preparado caso uma situação envolvendo preconceito ocorra, para que seja devidamente reportada e não mine a confiança do profissional em um processo já complexo de adaptação em uma nova região.Desvio de função: Muitas organizações fora do Brasil contam com uma falta de visão aplicada da cultura de produto no dia a dia da empresa.
A visão do gerenciamento de produto na Europa é tão (ou até mais) atrasada que no Brasil: é importante entender que pode haver esse gap ao ir para a região (diferente dos EUA, onde a gestão de produto foi concebida e é mais ativa e visível).
É relevante mencionar que muitas tecnologias vigentes no brasil ainda são novidade ou nem chegaram em países localizados na Europa, por exemplo: existe certo tom conservador em relação a iniciativas digitais por lá.
Pontos positivos
Em contrapartida, existem muitos pontos relevantes e positivos em uma experiência profissional: segundo ressaltado pelo próprio Fábio, trabalhar em uma empresa global traz diversos desafios relevantes para aprimoramento profissional.
Visibilidade de estratégias a nível global pode ser única nesse sentido. A avaliação de aumento da taxa de conversão, dependendo da região a ser abordada, é bem distinto nesse sentido.
A maior parte dos principais mercados das empresas localizadas na Europa, por exemplo, tem como principais mercados outros países. Ou seja, existe a necessidade de globalização nesse sentido.
Na Farfetch (maior marketplace do mundo) por exemplo, uma das empresas onde o Fábio atual, existe uma BU (Business Unit) apartada da empresa voltada especificamente para tratar da China, por conta das particularidades do mercado e sua relevância.
Know-how valioso para direcionamentos
Existem algumas questões importantes de serem avaliadas por pessoas que consideram realizar essa guinada na carreira, conforme destacadas abaixo por Fábio, que em breve divulgará uma plataforma própria para melhor gerenciá-las e discuti-las com seguidores:
Dependendo do motivo para emigrar, será possível atingir com mais facilidade a adaptação em determinado país/cultura. Ou seja, é difícil generalizar algo “padrão” para todas as pessoas.
Entretanto, trazer motivos à tona ajuda nesse sentido: é preciso ter consciência do que está sendo buscado, definindo um objetivo claro a partir dessa experiência ao emigrar para um novo país.Conversar com pessoas que atualmente residem em outro país/trabalham em determinada empresa. Assim é possível entender minimamente algumas percepções a respeito.
Estar aberto a novas experiências: pode parecer clichê, mas perguntar aos locais onde os locais mais gostam, conversar constantemente com pessoas para entender diferentes pontos de vista e pegar dicas para melhor adaptação pode ser interessante.
Esse artigo não tem a pretensão em dar uma resposta definitiva em relação as maiores dificuldades e oportunidades identificadas para a carreira de produto em outro país: a ideia aqui é trazer alguns possíveis direcionamentos e iniciativas relevantes que podem ajudar em uma coleta maior de insumos para que seja possível tomar uma decisão com o maior volume e qualidade de informações possível.
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