Li esses dias no Twitter (ou X, como você preferir) um texto da Sara Guo que me pegou. Ela escreve sobre “taste” sem a superficialidade com que o termo costuma aparecer em apresentações de pitch ou branding na gringa.
Em uma parte ela diz:
“This is taste. The relentless, almost painful ability to know what should exist, what shouldn't, and where quality matters. It's the difference between shipping a product and shipping a point of view.”
Isso resume bem o que ela propõe: taste não é apenas bom gosto visual. Não é escolher um tom de roxo bonito ou um grid perfeito. Taste é ter um ponto de vista. É escolher o que merece existir e o que deve ser recusado, mesmo que pareça útil ou que tenha mercado. É ter a disciplina dolorosa de manter um padrão de qualidade, mesmo que isso custe velocidade ou oportunidades imediatas.
Em português, a palavra “taste” não se traduz de forma simples. Literalmente seria paladar ou gosto. Mas aqui é mais do que isso. É critério. É julgamento refinado. É um senso estratégico do que é coerente com a visão do produto. Um filtro exigente e constante que não aceita atalhos.
A Sara descreve taste como algo que se manifesta em cada decisão minúscula. Não só no layout, mas no código, na copy, na estrutura de dados, na forma de vender.
“Most companies confuse taste with aesthetics. They hire a design agency, pick a nice font, and call it done. But real taste runs deeper—it's in the error messages, the loading states, the features you killed because they were merely good, not essential.”
Essa parte poderia servir de alerta para qualquer produto digital aqui no Brasil. Muitas empresas acreditam que contratar uma boa consultoria de branding e escolher uma fonte bonita resolve a questão do taste. Mas, como a Sara pontua, taste não é estética. É coerência.
Taste significa dizer não para features que não servem à visão, mesmo quando isso significa reduzir o mercado endereçável. Significa gastar dias aperfeiçoando um fluxo que o usuário mal vai perceber conscientemente, mas que vai sentir. Significa escolher o caminho técnico mais difícil só para oferecer uma experiência 10% melhor.
Em mercados competitivos, taste é um diferencial brutal. Porque é difícil de copiar. Porque exige alinhamento cultural. Porque demanda coragem para recusar atalhos.
A Sara dá exemplos que até então eu não tinha parado para olhar desse jeito. A Stripe não mostra um erro genérico de parâmetro inválido. Ela diz “esse número de cartão parece incorreto”. O Spotify não faz shuffle puramente aleatório, porque aleatório puro soa errado. Ele evita repetir artistas em sequência. O Notion esconde o handle de arrastar até o hover para evitar poluição visual.
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São escolhas pequenas, mas com implicações enormes. Porque mostram um produto construído com intenção.
“Real taste hurts. It's saying no to features that would triple your TAM. It's spending a week perfecting an interaction that users will barely notice—consciously.”
No Brasil, temos visto uma onda de valorização do design em startups, mas muitas vezes ainda falta essa parte. Existe o cuidado com o visual, mas não com a experiência inteira. Existe o foco em estética, mas não em coerência.
Na prática, taste é uma política de qualidade que se recusa a ser apenas aparência. Ele precisa viver no produto, no marketing, nas vendas, no suporte.
“Taste transforms chaos into clarity. Startups drown in micro-decisions... Teams with taste navigate by instinct.”
Em growth, por exemplo, é fácil perder taste. O mantra do “teste tudo” pode virar desculpa para incoerência. Adiciona-se qualquer feature para reduzir churn, qualquer botão para aumentar conversão, qualquer campanha para gerar MQL. Mas taste exige disciplina. Exige matar coisas boas para proteger o que é essencial.
Em tecnologia, a pressa de shippar pode corroer taste. Features são lançadas inacabadas. Roadmaps crescem sem controle. Clientes B2B grandes forçam customizações que diluem o produto. A Sara fala disso com clareza:
“Enterprise deals test this conviction daily. Large customers arrive with requirements docs and feature matrices, expecting you to check every box... That’s taste in action—knowing when giving customers what they ask for would break what they actually need.”
É um ponto especialmente relevante para quem vende software para empresas no Brasil, onde há muito “puxadinho” feito para fechar contrato. Muitas vezes, isso é celebrado como “customer centricity”, quando na verdade destrói coerência.
Taste não nasce do acaso. Sara explica que ele precisa de processos. Precisa de sistemas. Precisa de pessoas que se importam. Precisa de quem veja o produto como um organismo vivo que merece cuidado.
“You can guard taste with process, scale it through systems, but you can't teach it. The ability to feel the difference... that's pattern recognition built over thousands of hours.”
É aqui que ela acerta em cheio. Taste não escala sozinho. Ele precisa ser transmitido. Precisa ser praticado. Precisa de liderança.
Para times de produto, design, tecnologia e growth no Brasil, vale como provocação: vocês têm taste ou só dizem que têm? Vocês matariam um feature que traria mais receita porque ele não combina com a visão? Vocês investiriam dias num detalhe que ninguém pediu? Vocês têm coragem de recusar clientes que forçariam o produto a se tornar algo incoerente?
Taste é o oposto de agradar todo mundo. É alinhar a equipe inteira em torno de um ponto de vista. É criar confiança nos usuários porque tudo parece intencional.
No fim, taste não é um extra bonito. É um diferencial competitivo difícil de copiar. E que, no longo prazo, faz com que o mercado venha até você.
“Taste begins as loneliness and ends as leadership.”
É um lembrete poderoso. Taste pode começar com uma pessoa que se recusa a aceitar o “bom o suficiente”. Mas quando se espalha por uma equipe, por uma empresa inteira, ele vira uma vantagem que ninguém consegue imitar.
E talvez seja hora de mais empresas brasileiras encararem isso com seriedade. Faz sentido?
O livro Mítico Homem Mês apresenta a integridade conceitual (coerência entre as partes) como O Principal fator de sucesso de um software.
Concordo totalmente com seu texto, mas também AS VEZES entendo o lado das empresa. Perder o Taste as vezes pode significar a existência da empresa no mês seguinte.