Uma avaliação do potencial (desperdiçado) dos NFTs
O que um segmento deve fazer quando 95% dos seus ativos perdem totalmente seu valor?
É muito provável que você se recorde do ano de 2021 como o boom das NFTs (ou Non-Fungible Tokens), período onde eles atingiram o pico em relação ao volume transacionado, que chegou a ver quase U$ 2,8 bilhões de gastos por mês em negociações registradas no mês de agosto do mesmo ano.
Mais de 2 anos depois, como encontra-se esse mercado badalado e altamente especulativo? Segundo um report elaborado pela DappGambl intitulado “Dead NFTs: the evolving landscape of the NFT market", nada bem: o relatório fez a análise de 73.257 coleções de NFTs onde 69.795 delas apresentaram valor de mercado de zero Ether (ETH), a criptomoeda nativa da rede Ethereum.
O que isso significa? 95% dos NFTs disponíveis no mercado não têm mais valor de mercado.
Listagem por faixas de valor de NFTs avaliados pela DappGambl divulgado em setembro desse ano.
Pegando um exemplo prático: a coleção “Bored Ape” que fez com que diversas celebridades (como Justin Bieber e Neymar, apenas para citar dois exemplos) trocassem suas fotos de perfil em redes sociais por imagens de macacos com diferentes vestimentas, cores e expressões, chegaram a perder 97% de seu valor original.
No caso de Bieber, que comprou seu exemplar em janeiro de 2022 pelo valor recorde de U$ 1,3 milhões, o valor atual está avaliado em U$ 37 mil – uma queda de cerca de 97%.
Exemplar da coleção Bored Ape obtido por Justin Bieber.
Definições básicas: o que, exatamente, é um NFT?
A interpretação do que é um NFT parece simples depois de algum tempo pesquisando sobre o assunto, mas não é tão fácil explicá-lo ao seu pai, por exemplo. De forma geral o NFT é, de fato, um token não fungível (na tradução literal para o português).
Basicamente ele funciona como um certificado digital de autenticidade de determinada imagem, vídeo, GIF ou tantos outros formatos, atestando sua originalidade e status de pertencente a uma edição limitada.
Essas linhas de código normalmente são valorizadas por conta de exemplares de memes famosos (como o Nyan Cat de 2011, cujo GIF original foi vendido em 2021 pelo equivalente a U$ 600 mil) ou até mesmo por conta de coleções exclusivas, onde a escassez deveria (em teoria) ressaltar o valor real por determinadas peças (como os já citados Bored Apes ou os CryptoPunks).
Quais os principais motivos de declínio?
A pesquisa aponta um aspecto fundamental em relação a queda do valor real dos NFTs: em termos simples, não há demanda suficiente por eles para acompanhar a oferta. Ou seja, muitos vendedores querendo vender algo que poucas pessoas estão dispostas a pagar.
Entre os anos de 2021 e 2022 (período onde houve o pico tanto no valor transacionado quanto dos valores médios por NFT) foi criada uma “bolha” especulativa, que parece finalmente ter estourado em 2023.
Mais do que isso, apenas 21% dos donos de NFTs tem sua propriedade total. Isso significa que 79% de todas as coleções NFT não foram vendidas.
Participação em % de coleções de NFTs divulgados via report DappGambl.
Um dos possíveis motivos dessa percepção é justamente a falta do sentimento de escassez: por não se tratar de algo físico e sim digital, mesmo coleções com edições limitadas não passam o sentimento de exclusividade, como se fosse fácil replicar determinada imagem, por exemplo.
Memes de pessoas tirando prints de imagens NFT e discutindo com seus compradores originais se popularizaram no passado, justamente pelo conflito de percepções de valor dentre aqueles que enxergavam o uso da tecnologia como forma de investimento, e outras pessoas que não entendiam como algo tão facilmente replicado poderia ter tanto valor agregado.
Um paralelo com o mercado da arte
Outra possível razão (e essa talvez seja a maior delas) para a derrocada dos NFTs é a questão envolvendo a sua utilidade. A lógica por trás dessa tentativa inicial de monetização segue muito os passos do mercado da arte, que na época moderna inicia sua trajetória a partir do século XVII, onde é possível basicamente comprar determinado ativo por um valor inferior ao qual ele será avaliado no futuro.
Por trás dessa lógica existe tempo de maturação e atribuição de valor histórico em muitos dos casos, algo diferente do encontrado com os NFTs, tecnologia extremamente nova que ainda não está impressa no imaginário popular (por mais que muitas empresas queiram atribuir seus próprios nomes como forma de fomentar a demanda, como a NBA e a própria Disney).
O fim dos NFTs?
Existe uma frase do futurista e pesquisador estadunidense Roy Charles Amara que pode traduzir bem o momento atual pelo qual os NFTs estão passando:
“Tendemos a superestimar o efeito de uma tecnologia no curto prazo e a subestimar seu efeito no longo prazo”.
A forma de monetização desenvolvida via tecnologia blockchain (basicamente um mecanismo de banco de dados avançado que permite o compartilhamento transparente de informações em determinada rede) para os NFTs é algo extremamente promissor.
A oportunidade de comprar ativos específicos que são asseguradamente únicos e originais podem abrir diferentes oportunidades que vão muito além de imagens estáticas desenvolvidas por determinadas empresas.
A lógica do mercado de vendas de obras de arte não parece ser o ideal para extração de valor agregado a NFTs: existem outros segmentos que podem despertas insights promissores nesse sentido.
Possíveis futuros
Me colocando na posição de criar um Discovery com os NFTs, entendendo esse produto digital tão promissor mas em aparente estágio final de ciclo de vida, existem algumas alternativas para seu uso que passam pela diversificação de seu público-alvo.
Um segmento que poderia ser associado com facilidade a eles é o de videogames (onde já existem diferentes cases de sucesso): em um cenário de grande desejo por exclusividade para se destacar de outros players em jogos online, que já atingiu a marca de U$ 50 bilhões apenas em itens cosméticos (como skins, adereços etc), é muito fácil imaginar NFTs que possam atribuir ainda mais visibilidade aos jogadores que os possuírem.
E indo além: um determinado item mágico, ou uma arma que contenha algum tipo de vantagem especial, ou diversos outros possíveis usos podem ser atribuídos a diferentes mecânicas de jogos. Não é apenas uma linha de código que fica “parada”, sem uso imediato com a esperança de ser valorizada com o tempo.
Esse tipo de aplicação pode tornar o NFT não só “utilizável”, como atribuindo destaque perante outros jogadores: seria uma forma de uso prática para consequente distinção, um meio para um fim propriamente dito.
Outros possíveis segmentos que podem aproveitar a tecnologia no futuro seriam o governamental (para atribuir documentações únicas para cada cidadão, por exemplo) ou voltado ao mercado de eventos (sejam virtuais ou reais, concedendo benefícios exclusivos a quem detenha determinada permissão para acesso aos bastidores ou o early stage de um artista).
Existem diversos usos que podem aprimorar os NFTs para serem explorados por diferentes marcas e empresas, desde que a lógica por trás deles levem em consideração uma premissa básica, que parece não ter sido priorizada com a bolha gerada pela especulação de seus preços: gerar um valor real aos seus clientes.
A nossa newsletter é gratuita e o que nos motiva escrever é ajudar com conteúdo como este, as pessoas. Se gostou, compartilhe com seus amigos e na sua rede social.
Se quiser compartilhar via WhatsApp, clique no botão abaixo…